O Grito por Raquel Zichelle

O Grito por Raquel Zichelle

Quando olho para imagens da pintura de Edvard Munch, título homônimo, fico me perguntando como seria o som do grito.

Tenho a impressão de que começa com um som gutural, grave, difícil de sair, preso na garganta, um grito abafado, sufocado, dolorido, amargurado, sofrido, seco, agarrado às pregas vocais, machucando-as, deixando um gosto de sangue na boca. O silêncio ora petrificado no peito, agora tenta descalcificar o horror da existência. O som do grito nasce de frestas da pedreira que começa a ruir. E, a cada pedaço de rocha que se rompe, o som fica mais audível, ganha presença, corpo, começa a tomar a cena, a vibrar mais rápido! O grito estremece corpo, figuras, tintas... O grito chega ao ápice, estridente, rompendo, de vez, com qualquer barreira interna. O grito dói de tão agudo! Mas é a expressão pura do sofrimento, do insuportável, da clausura que é habitar a si mesmo, do absurdo da existência. Do horror que aquele ser pálido, aflito, minguante, presencia.

E o som estoura os tímpanos!
Mas sai mudo do quadro!
O grito grita em mim, reverbera dentro... dentro... do meu ser.
Em algum lugar, aqui dentro, tem um serzinho pálido, minguando, gritando... Com os olhos aterrorizados de quem viu a Morte.
Uma provocação sinestésica: não se escuta, mas se enxerga o grito!
Ou, ao menos, se escutamos, é algo parecido como ouvir uma memória pincelada na mente...
Não é à toa que este quadro é um dos meus favoritos e cause tanto impacto, arrepio, deslumbramento, assombro, comunhão...

Escrito por Raquel Zichelle - 28/09/17

Imagem: Pintura em aquarela pelo artista Christian Kuzma

Sobre a autora

"Gosto de escrever, ler, fazer arte (principalmente, teatro), brincar com meus sobrinhos, dar aulas. Também gosto de bichos de pelúcia, estrelas, bolhas de sabão e arco-íris..."

Raquel é atriz, artista-educadora, escritora. 

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09 dee Setembro de 2024